Inverno
Foram ventos fortes em tardes frias
Com folhas tristes e abatidas ao chão
Fotos, zumbidos e rostos esmigalhados em memória
Rajadas ao peito, serenos cortados à garganta.
Lábios rachados e almas vazias
Tantos passos pueris
Passeios perdidos em bosques de flores
Nos parques gentis
Em cidades, campos e jardins suspensos de alecrim
Cada passo, cada trânsito, todo infinito em segundos
Em um instante e um relâmpago em mim
Quando visitei confins esquecidos dos seios vis
Eu vi, estive, passei por colibris às alturas
Em arranha-céus com meus olhos febris
Cheios de vida e misericórdia
Da paz que ainda restou e existe aqui.
Nos olhos vagos e cheios de esperanças
Com desejos acolhidos em horizontes erigidos
De glórias, verdades, espantos e prantos
Eu não lamento sequer um grito escondido
Qualquer zumbido perdido, reza ou oferenda nos montes sagrados
Porque estive em meio à chuva, ao frio e as tempestades
Passei incólume aos vendavais impuros
Dos jugos e juros difames
Distante, calado e com frio ardil
Com o sangue gelado e a alma intocável
Cruzei vales, estradas sem fim, calçadas e ladrilhos
Com as mãos congeladas de graças inesperadas
Com nuvens carregadas, gotas espessas, árvores esparsas por campos e delírios. Por fendas abertas em meio aos pesadelos ruins.
Como não viver a memória viva enfim
Quando chuvas torrentes e o coração quente passaram por mim
Nos trilhos de pensamentos longínquos
Único, afastado, encontro a razão para existir
Para seguir mesmo quando o frio nos esconde das sombras
Ilumina por dentro, enquanto espanta e resfria vidas sem brilhos ou afins.
Sim, sim, eram invernos intermináveis
Tempos cruzados por histórias sem fim
Cruzadas de vidas invisíveis
De almas frígidas que atravessam climas risíveis
Daqueles momentos molhados enquanto labirintos saiam por degraus feitos de desejos incautos e sentimentos emaranhados.
Ah, eu passei invernos em minh'alma
Com destreza e desdém de quem não senti
Nem percebi qualquer verdade sagrada
Ou sacramento velado
Nada estava selado
Nem o inverno fechou as portas ou trancou as janelas
Daqueles sonhos quentes enquanto sentia frio
Quando cruzeis templos e, perplexo, quase sucumbi...
Eu cruzo os invernos quão forem necessários
Com espírito templário e ordem dos cavaleiros dos céus
Sagrado, mitigado, mesmo com medos disfarçados
Trago o verão enquanto o frio castiga os campos de trigo
Mas não enveredam por sertões de vidas intensas dentro e aqui, sim, em mim.
Pedro Lichtnow é jornalista, poeta e escritor existencialista.
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