quarta-feira, 31 de maio de 2023

Poemas Urbanos.

 SÚPLICA

Poemas Urbanos por Pedro LICHTNOW. 
Imagem do arquivo do autor. 


SÚPLICA

 

Eu velo o silêncio em mim

Carrego a dor no peito

O sacramento, a hóstia e as hastes do medo

 

Pelas ruas e cortiços

Em cinzas batismais

Por lanças, ferros e ornamentos

Os abismos se desmancham em segredos retidos em declínio


Quantas súplicas sagradas

Quantas almas feridas

Orações perdidas

Todos os mesmos santos

Vidas bandidas

 

De quem amou o remorso

Sentiu o pesar

Despedidas distantes

Por lugares insanos

 

São castigos, castiçais de luz e abrigos

Pedaços despedaçados aos montes

Mentes consumidas em pensamentos vagos

Corações infinitos

 

Tristes, sensatos, inconstantes...

 

Que nunca cansam de sofrer

Nunca, nunca sentem as lanças das chamas

 

Nem cortes, rasgos ou domínios perdidos

 

Ah, são muitos abismos em um mundo apenas

Tantos vales de súplica e clemência

Sentimentos viris, abrigos invioláveis

Por estradas e chãos batidos

 

Batinas e ritos impuros

Com as mãos nas grades

O coração partido

A solidão que invade

A mansão de todos os mundos

 

Um minuto de paz e reverência...

 

Do mendigo ao fidalgo

Nos cantos espreitos e insensíveis.

 

Eu suplico de longe sem intenção

Vejo masmorras e reinos infames

Desejos impuros, prazeres pudicos

 

Ao passar por prédios e portões

Carrego correntes nos pés

Pórticos insólitos

 

Ah, sou o sonho livre em expansão

Os pés frenéticos e o mundo estranho

O olhar profundo e o azul solúvel

 

Meus olhos têm o oceano infinito

O universo escuro

A vida reflexiva

O mundo em frascos inflexíveis 

Submundos e vassalos largados

 

Por isso, suplico pela fresta do portão

Do lado de fora de conventos e perdições

Ao passar por zumbis noturnos e pássaros da noite

Navego em estreitos de emoções e pouca razão

 

Quem ora ao fundo e enxerga a luz em meio à escuridão?

Acende a vela e leva o castiçal entre as mãos.

 

Quem são eles sôfregos

Intrusos dos infernos

Purgatórios sem redenção

 

Súplicas ecoam e vagam sonoras

Oram pelo mundo, menos em vão.

 

Olho para o fundo e não vejo nada

Somente almas sacras

Sonhos perdidos por momentos vedados

 

Eu velo as ruas

Celo medos em cada passo

No seio da minha alma

Em meio às sensações

 

Tudo parece seco e ácido

Um deserto de medos corrompidos

 

Relentos cheios de vento

O abismo do fim dos tempos

 

Predizes a vida?

Queres tudo em um minuto?

Quem sabe o fôlego da caminhada cativa

 

Somos altivos...

Em pegadas frágeis, mas nocivas

 

São raras as chances indevidas

As preces e Macunaímas

As praças, esculturas

Monumentos esculpidos

 

Estás livre ao céu noturno

Com memórias em pedra

Peles e cardumes urbanos

Nas calçadas rebeldes

 

Quem são eles com a vela na mão?

Em confissões conhecidas

Perdidos, serenos e cautelosos

 

Nos becos da vida

Em confessionários pagãos

Cobertos de ouro

Vestidos de medo

 

Sem nenhuma misericórdia ou perdão

 

Quais preces valem à pena sem restos?

Pedidos ou queixas em vão

O que desejam de longe

Com os olhos singelos

O peito aberto

O medo inquieto

 

Por uma vida sem dor

Sem anseios

 

Solidão ou menos sentidos

Contrassensos no meio de rajadas

Ao som do tempo casto

 

Das palavras ou sussurros temidos

Eu suplico em vão

 

Ouço clemências

Demências, loucuras, lastros

 

Retiros santos de anjos mórbidos

Na terra de areia branca

Em assoalhos espalhados pelo chão

 

São súplicas e batismos escuros do silêncio

Reféns delas, dos outros, do mundo, da graça insensata

 

Com olhos sagrados e horizontes distantes

Pedimos impacientes por milagres indiscretos

 

Perdidos em tempos escuros e caravanas de escravos

 

De um mundo terreno

Pouco sutil e verdadeiro

 

Ao passar por templos

Terreiros, cortinas e cortiços

Por caminhos indevidos

 

Suplico pela fresta

Pela ponta da lança

Com os olhos rasgados e o futuro imprevisto

 

Eu Suplico!!!!

 

Por algo

Alguém, um espírito, um santo

 

Por mim e mais ninguém

Por ego e reverência

 

Ao mundo oculto

 

Por meu abismo.

Por minha vida urbana

O tempo perdido, o agora extinto

 

Somos distintos e abstratos....

Eu suplico a súplica dos anjos caídos

 

Pedro LICHTNOW 

E autor dos livros Catarse e Quem sou eu? Também sou coautor do livro “Rodovias, Caminhos entre Culturas”, com edições em português e em inglês. 

 





Um comentário:

MARIA TERESA MARINS FREIRE disse...

Brilhante poema! Meus aplausos por tão significativos e intensos versos!!