Poemas Urbanos |
A MINHA PARIS
Curitiba é minha Paris
Minha solidão sensata
Aos passos moribundos
De céus escuros e lastros
Do tempo dos ladrilhos frios
De noites geladas
Dos cabarés escuros
Das mulheres de cetim
De sinais vermelhos, serenos
Ao Sena e às neblinas do palácio
À XV vívida na retina
Às câmeras da madrugada
Ao som de passadas pesadas
O passado nunca se vai
Ele permanece no canto calado, quieto e vivo
Sem som ou vícios
Com cortinas e fumaças,
Artistas, verdades e mentiras
Ilusões perdidas
Esperanças ávidas
Curitiba de alma, prazeres, carnes
Cobiças
Suspeitas e armadilhas
De saias alongadas, quantas feridas...
Curitiba, minha Paris
Minha menina
Divã, santa e blasfêmia
Com dias fechados e céu nublado
Em outonos estranhos e verões passageiros
Traz o passado, a vida e o tempo
Quando burla os sonhos
Abre clarões às sombras
Furta sensações e hipocrisia
Quando mentia para existir no seio compelido
Em meio aos poderes secretos
À vaidade envaidecida
Minha Paris enche minha alma
Sufoca a própria vida
Volta às faces de Curitiba
Carrega o meu coração
Existe em farsas e compaixões
Tensos, tensões, medos obscuros
Quando os tempos transpassam
As vidas cruzam
Os amores devolvem
O espírito da morte
A ressurreição dos astros
Minha Paris
Enigmática, cigana, mordaz
De cúpulas sociais
Templos abismais
Quando os ventos cortam o tempo
Vestem a nova vida
A noiva, o sereno, eu vejo a mim agora e antes
Em um mundo distante
De ventanias
Ventos e uivos ocultos
Disparos e sirenes aos sinos de vidros
Quando o tempo perpassa
Cobre o corpo dilatam o momento
Em pensamentos súbitos
De pensadores
De livros achados
Em masmorras de concreto
Em paredes pixadas
Ah, Curitiba, minha Paris alada
Seus bosques secretos
Seus espaços públicos, júbilos
São sagrados, mórbidos, benditos
Quando as sombras iluminam
Voos vazados nos cumes e declives perdidos
Quantos homens
Sonâmbulos embriagados
Correm, caminham, passam
Sujos, perplexos, ensandecidos
Escárnios são escárnios
Almas relentas
Sedentos, vagos, pérfidos
Tantos fartos
Fardos
Pesos incensos, insossos
Contrassensos do mundo
Olhos vazios e escuros
Cigarros, sabores, cafés, pedidos
Insólitos, luzes foscas em prédios
Mundos esquecidos
Universos separados
Vidas seladas em loucuras esparsas
Momentos estreitos
Ruas diagonais
Vidas abarcadas
Vidas viscerais
Escadas, ladrilhos, labirintos, largos, assaltos à alma
Famintos, sorridentes
Em noites perdidas
Ao som das charretes
De cavalgadas.
Das estrelas e da madrugada
Nos becos falidos
Na Île de France
Às praças vultosas
Às matrizes e meretrizes
Ao conhaque pulsante
Às luzes fumegantes
Curitiba é a minha Paris
A minha luz abandonada
Ribalta, atriz forasteira
De imigrantes, províncias e provincianos
Carolas, fraques, bigodes, velhos sarcásticos
Jovens bêbados, doentes embriagados
Giras, presos, hospícios abertos e livres nos cantos caídos
Minha Paris
Estarrecida
Com luzes morna e aquecidas
Em postes adormecidos
De vidas largadas e lagartas sem pele
Paradas, imóveis e imortais nos becos vadios
Todos sempre correm por uma pressa sem sentido
Nas esquinas barulhentas e efervescentes
Por uma cama ao som dos trens
Em trilhos e riscos imaculados
Vagam aos próprios passos
Minha Paris
Minhas Pinhas elevadas
Meus princípios
Começos, recomeços
Em olhares furtivos
Por meios vastos
Encantos sutis
Por selos e chancelas
Nos centros proibidos
Curitiba é a Minha Paris
A cidade mais bela
Com ruas camufladas
Corpos secretos
Cobertos por flores, perfumes e cheiros abertos
Flores de outono
Presépios escarnecidos
Ritos, paródias, memórias distantes
São flamejantes
Das mãos escorridas
Dos cafés moídos
De gostos proibidos
De letras esculpidas em noites perdidas
Paris é minha Curitiba
Em filas sagradas, tumultos e desgraças
Aos pães velados
Por almas vazias
Nas ruas desertas
Por uma vida vadia
Em um mundo perverso.
Sem remorsos ou prelúdios
Aos parques e praças
As ilhas em desgraça
As artes pueris
Aos mortos ávidos
Em becos escuros
Nos trechos insensatos
Por meios estranhos
Encontros fadados
Paris é minha Curitiba
Eu volto ao trono dos gênios
Ao quarto solitário
À solidão confusa
Ao caos da noite
Às manhãs apressadas
Curitiba, sim, minha Paris!
Meu reduto dos romances e fracassos
Das vitórias utópicas
Da Paris rejuvenescida em faces inesperadas
Minha Paris de passos largos ao passado
De volta ao presente
Em teu seio estou aqui!
Por meio dos meus pés e das minhas mãos ferozes
Minha Paris é ali, agora e antes....
Nunca mais vou esquecer-te.
Pedro Lichtnow
Um comentário:
Gostei imensamente! O poema nos leva por uma Curitiba como é, mas envolta na neblina poética, transformando a cidade em sonho, cobiça, encantamento, becos escuros e espaços claros e flamejantes! Esse poema deveria ser a verdadeira divulgação da cidade, para os que não a conhecem! Brilhante!
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