quinta-feira, 26 de novembro de 2020

 The Crown vai além dos muros da realeza para mostrar as fraquezas humanas.

Se eliminarmos os muros que separam a realeza britânica do restante do mundo que a cerca, o que encontraremos? Guardadas as devidas proporções, talvez mais semelhanças com a vida convencional do que possamos imaginar. Ao menos é o que a série The Crown, exibida na Netflix, nos mostra, ao imergir os espectadores nos bastidores da Família Real Britânica para focar, especialmente, nos conflitos de relacionamento entre seus membros.

Problemas no casamento, distanciamento dos filhos, disputa por atenção... esses são alguns dos conflitos vividos pela realeza, na concepção retratada na série. Conflitos que permeiam nossas vidas, podendo gerar pontos de identificação com o público, e que se acirram ainda mais na quarta temporada que estreou, recentemente, no dia 15 de novembro de 2020, sendo uma das mais aguardadas pelos espectadores até então.


Motivos para tal expectativa não faltaram, já que a nova temporada trouxe mais duas personalidades femininas muito fortes e presentes, Margaret Tatcher, interpretada pela Gillian Anderson, e Diana Spencer, interpretada por Emma Corrin. Ambas as atrizes souberam dar vivacidade a seus personagens e às inúmeras relações conflituosas vivenciadas por elas.

Enquanto Gillian Anderson encarnou a primeira-ministra britânica de forma espetacular, comunicando pelo gesto e pelo olhar a forma rígida e fria com que sua personagem encarava, muitas vezes, os problemas que apareciam; Emma soube transmitir a doçura da Princesa Diana apenas pelo olhar. Ela ainda traduziu, com sua expressão facial, o sofrimento interno da personagem, que vivia em conflito com seu marido, o Príncipe Charles.  O casamento extremamente conturbado de ambos foi, inclusive, um dos destaques da quarta temporada.

No entanto, quem esperava uma cena memorável do casamento entre o Príncipe Charles e a Princesa Diana pode ter se frustrado, já que a série não retratou tal acontecimento, que atraiu holofotes midiáticos do mundo todo no ano de 1981. Questionada sobre tal situação, a atriz Emma Corrin disse em uma entrevista que, para uma cena ser recriada, ela necessita fazer parte da história, estar relacionada com o enredo. A frase de Emma é coerente com a proposta da série, que visa mostrar a realeza britânica por trás dos muros que a isolam da população, ou seja, aquilo que não é exibido explicitamente.

Independentemente de The Crown ter ou não mesclado ficção com realidade - não podemos nos esquecer de que a série constitui uma representação imagética da Família Real Britânica, dentre tantas outras, afinal nunca enxergamos a realidade, mas as imagens construídas a partir dela e que nos são mostradas –, ela conecta sociedade e realeza por meio de conflitos muitas vezes causados por um dos maiores incômodos: a dificuldade do ser humano em lidar com o “eu”.

Tal implicação também se revela nas disputas de poder entre os personagens, especialmente aqueles que se incomodam por serem ofuscados pela Rainha Elizabeth, interpretada com maestria por Olivia Colman. O mais irônico é que ela também se incomoda ao se sentir uma mera coadjuvante por não poder interferir na política britânica. Personagens em busca de atenção, mas que se encontram perdidas internamente.

Portanto, independente de ser realidade ou ficção, The Crown atravessa os muros da realeza para realçar aquilo que muitos buscam ocultar: o ser humano em sua essência.

Texto escrito por Mariana Mascarenhas

Jornalista e pesquisadora do Centro de Estudos Logoimagéticos CONDES-FOTÓS: centro de pesquisas destinado a estudar o poder das imagens na sociedade.

Para saber mais sobre a série The Crown, sob o aspecto imagético, acesse: www.youtube.com/watch?v=IW5bH2LMRZ0

Site do CONDES-FOTÓS: condesfotosimagolab.com.br

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